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Foto do escritorPaula Brandao

Matilde Sofia - Pela janela

Atualizado: 16 de set. de 2020


Tudo pode ser visto através de uma janela. Não importa qual moldura diante do olhar, ela simplesmente abre para um novo entardecer, seja mais tarde, seja logo após a hora do meio dia. Olhando por ela, é possível desvendar sonhos, perceber a realidade. Nem mesmo as vidraças são capazes de tirar as descobertas, quando o horizonte ao longe se abre pela frente.

Matilde Sofia acordou reflexiva. Chamou a amiga e o amigo para um passeio em uma cidade próxima. Foram de carro. Matilde Sofia foi no banco de trás.

“Assim me vejo pelas formas retangulares deste lugar” – disse. “Estamos aqui, em simples momento de retribuição à vida, pela oportunidade de unicamente sairmos dos nossos casulos e sentirmos o prazer de nossa companhia mútua” – continuou.

O amigo, que estava dirigindo indagou: “Oi?”

Matilde Sofia continuou.

“É um lugar simples e eu digo, com certa ousadia, que um tanto refinado. Fica ao final de uma rua de pedra, com casas em suas meras pontas de sobrevivência.”

A amiga, olhando para o amigo, indagou também: “O que você está falando?”

Matilde Sofia continuou.

“Para chegar até esse lugar, existe uma estrada longa de asfalto já poluído pelo tempo, que de certa forma traz curvas no alto de um caminho nem tão alto assim. Mas em dado momento, ele se transforma em terra, desvendando o tom vermelho do chão batido, empoeirado pela falta de chuva momentânea. Algumas pedras encrustam pontas misteriosas que parecem soltas ao vento, porém sua rigidez não as deixa cair, nem mesmo por um segundo, nem mesmo por motivo qualquer. O único som que se ouve é o barulho do carro, rangendo por este caminho que fotografa as nuances mais belas entre sol, terra e chão.”

O amigo de Matilde Sofia, não se contendo, perguntou: “Matilde Sofia, do que você está falando? Não estamos entendendo nada!”

A amiga completou: “Mas onde você está com a cabeça? Você está assim desde que você saiu com o Juninho”.

Matilde Sofia, olhando para os dois, prosseguiu.

“O lugarejo é simples, local de causos e fatos, mais causos certamente. Lá, um silêncio inesperado, pelo qual o barulho dos sapatos passeiam, criando uma sinfonia em notas de pedras e calçamentos. Há muito para se ver ali, por exemplo, a senhora simples que bate sua estaca no mesmo ponto da rua, milhões de vezes, seguindo o curso de sua vida rotineira, marcada pelas rugas lindamente esculpidas em seu rosto maternal. Vocês não acham?” – pediu que concordassem. “Os dentes falhos, beleza de sua luta, conflitos e descobertas pessoais. O senhor já de idade que vê o tempo passar, como se esperando para contar as gotas de orvalho no início da noite, hora de adentrar em seu recanto, feito de alvenaria e pintura do interior de um lugar qualquer. E outros muitos.”

A amiga de Matilde Sofia, neste momento, falou que se ela continuasse com o papo sem nexo iria voltar para casa.

Matilde Sofia questionou se eles não viam as nuances dos pensamentos e seguiu o raciocínio. Mas, antes um caminhão buzinou no sentido oposto, assustando os três.

“Meus passos seguem sorrindo, acompanhados de outros passos, que me trazem a poesia e a simplicidade de longe, com serenidade, talvez desconfiança da vida e aconchego pelo mundo. Basta olhar. É preciso ser livre, por algum tempo.”

Finalmente, chegaram na cidadezinha.

Após caminharem um pouco, encontraram um local para uma refeição. Do carro até la, Matilde Sofia narrou.

“Eu me identifico com este lugar. Comida de roça, panelas gigantes de pedra de onde os cheiros se misturam. São lindos os pássaros que revoam por aqui.”

Os três buscaram uma mesa próxima do buffet. E foi então, que olharam pela janela. Ao longe o degrade das cores do céu, de perto três amigos, dois deles, perdidos.

Matilde Sofia tomou um gole de água e continuou.

“Somos somente nós, na pura essência de cada um, no mais verdadeiro sentido, nos conhecendo um pouco mais.”

A amiga de Matilde Sofia, vendo o caso perdido e a insistência da amiga, começou a cantarolar uma música. O amigo ensaiou o batuque na mesa.

Neste momento, o garçom passou por eles e fez uma cara de mistério, como se quisesse desvendar o que estava acontecendo naquela mesa. Era hilária a feição dele, que não sabia se interrompia perguntando se precisavam alguma coisa ou se esperava um espaço e oportunidade para também interromper.

Matilde Sofia confessou.

“Essa janela divide espaço comigo, e vejo as cores da cidade. Os casebres logo à minha frente, cada qual com sua cor forte, rosa, verde, amarelo, azul, marrom, trazem charme e exuberância para esse lugar. Poderia ficar aqui, incomodada comigo mesma, buscando os mais remotos pensamentos.”

E, após alguns instantes de divagação, Matilde Sofia voltou o olhar para dentro do estabelecimento. Os amigos já estavam servindo o almoço, o garçom havia desistido. Foi quando ela viu um conhecido de longa data e o abraçou, iniciando um papo normal, convidando-o para fazer parte do grupo. “Pessoal, este é o Roberto”.

O amigo e a amiga de Matilde Sofia ficaram perplexos com a mudança brusca e olharam para Roberto tentando adivinhar qual a mágica que ele produzira em tão pouco tempo e que trouxe Matilde Sofia para a normalidade.

Um sino tocou lá fora, com o garçom explicando que era o anúncio da parte da tarde, pois cidade do interior pequena era daquele jeito.

Roberto interagiu rapidamente e os quatro iniciaram um papo agradável sobre utilidades inúteis. De tempos em tempos, o amigo de Matilde Sofia e a amiga entreolhavam-se, tentando encontrar uma explicação plausível.

Saíram dali pé ante pé, em direção ao mesmo caminho. Em certo instante, olharam para trás e viram uma casa no final da rua. Rumaram um pouco mais para frente, até o banco da praça, em frente à uma igreja local e sentaram-se por um instante. Ali permaneceram até que caminharam mais um pouco e divertiram-se até pegarem a estrada de volta. Roberto pegou carona com eles.

Ao sair da cidade, resolveram observar a natureza que os cercava. De repente, Roberto começou a espirrar ininterruptamente, pois era alérgico e a poeira havia desbalanceado um pouco suas vias respiratórias.

O amigo de Matilde Sofia olhou para a amiga, como que sinalizando o pensamento de que na ida, reflexão e na volta... não precisou completar a frase, que foi entendida imediatamente.

Matilde Sofia respondia “Deus te crie”, após cada espirro.

E lá se foram eles de volta para casa, intercalando a complexidade com um simples fato da vida e a falta de senso total.

Finalmente chegaram na casa de Roberto, que os convidou a esticarem o passeio.

Matilde Sofia, a amiga e o amigo aceitaram. Estavam em sintonia, apesar do dia inusitado. Iriam assistir um filme novo que Roberto havia indicado.

No meio do filme, Matilde Sofia pensou sobre uma frase que falou anteriormente, porém todos continuaram em silêncio, até que o riso agudo tomou conta da amiga e do amigo de Matilde Sofia. Não aguentaram mais segurar o ímpeto.

Roberto não entendeu o fato, porém riu em solidariedade.

Quanto a Matilde Sofia, ah sim! Ela explicou tim tim por tim tim sobre o recital da ida.

Se alguém entendeu, não sei, deixo por conta de você, leitor, o entendimento a explicação das passagens finais deste conto.

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